segunda-feira, 23 de janeiro de 2017

Desabafo sobre a Paixão


A paixão é usar roupa de mergulho e snorkel para se atirar em um copo d’água. A paixão não é, simplesmente, sentir borboletas no estômago, mas dragões flamejantes no tubo digestório. A paixão é mirar um precipício repleto de belezas e se arremessar nele. A paixão é o sangue que brota da natureza, disposto a desafiar as profundezas da essência humana com seu potencial. A paixão é o amor que verte dos corações límpidos e puros, para que a vida seja, novamente, significada. A paixão é arte meticulosa, cujos retratos revelam as nuances da vida. A paixão é o tesão inabalável que arrebate os corpos e as almas. A paixão é romance, magia, deslumbramento, êxtase, gozo inenarrável, lascívia e volúpia. A paixão é amor não engessado, sentimento não represado, rio que corre em direção ao infinito. A paixão é vida, movimento e flama. A paixão é, apenas, a paixão. Lembro-me de ter me apaixonado, primeiramente, aos dois anos de idade. Naquela época, já me sentia um amante romântico. Eu me reapaixonei aos cinco, dez, quinze, dezesseis e dezessete anos. Paixão é, sim, uma mínima forma de amar, por a qual vivenciei em todos os estágios de minha curta vida. Eu já chorei por essa sensação, já me desesperei. Liguei para meus amigos, desabafando afetos intensos de madrugada. Fiz prosas imensas, poesias densas e desenhos desfigurados somente para escancarar paixão. Não me arrependo nem um pouco, porque paixão deve, sim, ser vivida. Basicamente, paixão é carpe diem. É por isso que me apaixonei por Áries, Touro, Gêmeos, Leão, Virgem, Escorpião, Sagitário, Capricórnio, Aquário e Peixes. Não citei Câncer nem Libra, porque esses, é claro, são paixões puras. Eu me apaixonei por escritas encantadas, versos suaves, estrofes inundadas de sentimento e palavras ditas ao vento. Eu me apaixonei por olhares límpidos, beijos cálidos, toques eletrizantes e corações doces. Eu me apaixonei por promessas supostas como eternas, desejos sexuais e idealizações socrático-platônicas. Eu me apaixonei pela simplicidade, pelo requinte, pela luxúria e pela vaidade. Provavelmente, posso me apaixonar por você que me lê – ou, quem sabe, já não tenha me apaixonado antes. Eu me apaixonei, também, por filosofia, artes e ciências. Portanto, se, por devaneios, eu diga que quero viver um amor neoclássico, cheio de vontade de potência e estável como um sistema conservativo de forças; vá por mim, eu estou apaixonado. Viviane Mosé corroba que o sofrimento vem da vida. Eu ratifico: a paixão vem da vida. Então, como tratou Florbela Espanca, “que eu saiba me perder para me encontrar”, pois a paixão, essa mesma, sempre estará lá. Estar apaixonado desgasta, confesso. Não apenas eu compartilho desse pensamento, como também Mário Sérgio Cortella. Entretanto, que eu aceite as marés de destruição para me reconstruir por dentro e por fora. Que desgaste nenhum me pare, pois minha resiliência apaixonada sempre será maior. É... paixão é existir – e como disse Clarice Lispector: “existir é coisa de doido, caso de loucura”. Eu me apaixonei por pessoas erradas em tempos errantes. Nada que me desmantele por ora, pois eu me torno pleno diante disso. Enfim, sou, de acordo com Machado de Assis, uma errata pensante. Se a paixão não for recíproca, por favor, entenda que, ainda assim, houve paixão – quer dizer, valeu a pena. “Eu sou eu, e você é você. É lindo, é vasto, vai durar” (obrigado, Clarice). A paixão sempre vale a pena. Sempre. Foi pensando nisso que, a me deparar no espelho, eu me apaixonei à primeira vista – e, dessa vez, foi uma via de mão dupla. Eu me apaixonei por mim mesmo. E esse é o melhor conselho que daria a alguém: apaixone-se por si mesmo. “Por isso, cante, chore, dance, ria e viva intensamente, antes que a cortina se feche e a peça termine sem aplausos” (obrigado, Charlie Chaplin). Vá se apaixonar por si mesmo, sinta o que é carpe diem. Hoje, acordei apaixonado e disposto a me reapaixonar. Que eu saiba me reapaixonar por minha família, meus amigos, minha escrita, meus pensamentos. Que eu saiba me reapaixonar por mim, em todas as minhas qualidades e todos os meus defeitos. Que eu saiba me apaixonar pela vida, pelo fogo, pelo movimento, pelo devir. Não há um momento perdido quando se está apaixonado. Eu não me arrependo de nada – eu vivi. Quero continuar sentindo isso até que meus dias se encerrem. Isso clama de meu mais fundo âmago. Que eu me apaixone – e que todos se apaixonem. Afinal, quando foi a última vez que você se apaixonou?"


Por Sergio Chociay Junior

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